Guarde isso: alguma coisa sempre faz falta. Guarde sem dor, embora doa, e em segredo. C.F.A

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Enfim

E de manhã, ao acordar, aquela brisa te toca o rosto; a brisa que deixa tudo mais frio e confortável, que vem caladinha encher o ambiente de ar e dispersar cada foco de fumaça que te sufoca, uma brisa desejada à cada falta de ar que a dor causa, que ameniza todo o desconforto das atitudes mal tomadas e das palavras que jamais deveriam ser pronunciadas. Ela leva consigo todo o peso do não, do fim e do medo do sim, e leve, te mostra que há delicadeza suficiente entre tanta indiferença. Quatro olhos se encontrarão, em silêncio, tentando estabelecer qualquer ponta de diálogo que o tempo planejou, pois a brisa trás de volta o que insiste em partir, põe na tua frente, para que aquele piscar de olhos, único e triste, te lembre que a saudade só fará sentido e só será aproveitada se existir distância entre você e o que o sentimento te projeta.

(Sugestão de música: "Seu Olhar" por Seu Jorge. Estava ouvindo quando escrevi)

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Físisa aplicada


Estudos da dinâmica me ensinaram que móveis em rampas levemente inclinadas em um ângulo agudo, com a ajuda da força gravitacional e a influência do peso, e este igualando-se ou superando a normal e o atrito, vivem na "iminência" de queda. É bem verdade que tudo hoje é iminente, tudo está quase caindo, chegando ou saindo; corremos riscos à todo instante de tempo, espontâneamente, nada planejado ou calculado, exceto para aqueles que crêem no destino. Eu acredito, mas também defendo o direito ao livre arbítrio, porque é possível unir ambos, posso acreditar que embora a vida já esteja definida do momento que nascemos ao momento que morremos, é possivel impor escolhas e mudar alguns pontos, embora desconhecidos. Basicamente somos um móvel na ponta de um cone, isso nos proporciona 360º de rampas, e a iminência de queda para inúmeros lugares, esse é o destino, diversos caminhos já traçados, o livre arbítrio é a capacidade de escolher um deles, e a partir de então esperar que tudo aconteça como deve, mas o que vai acontecer pertence somente ao destino, considerando assim que a nossa liberdade não nos permite programar a montagem de um albúm de fotos, apenas escolher em qual deles queremos estar, a produção cabe apenas a um ser superior. O que afirmo é: não sei se essa é a vida que pedi a Deus, mas é a que ele tem me proporcionado para escolher.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Um narciso para Elson Junior

Hoje vim falar sobre flores, especificamente os narcisos, belos, mas tão belos quanto qualquer rosa em qualquer jardim de qualquer canto dos campos Elísios possa ser, tão cheiroso que as lagrimas saltam aos olhos com tamanho aroma, tão leve que as abelhas disputam a delicadesa exagerada do seu pólem, uma flor que se foi como tantas outras, murchou de acordo com o ciclo natual das flores.

Há mais de dois anos cultivo comigo o prazer da presença de dois grandes amigos, e por eles guardo um sentimento tão forte quanto qualquer outro, formamos o trio, não apenas isso, formamos um trio de três, com um sabor agridoce resultado de uma mistura de costumes, a união de uma gaúcha, um fluminense e um pernambucano, a harmonia mais sublime que presenciei até os dias de hoje, e dessa união brotaram flores, a dona Renilda Narcisio, ou simplesmente tia Rê, mãe do Elson Junior (vulgo Idiota), o tal fluminese, e ela nos adotou (a Vanessa e eu) primeiro como sobrinhos, depois como filhos, e assim sentimos que eramos enfim, irmãos separados pelo destino. Com a tia Rê aprendi a fazer pudim de um jeito diferente, tudo por dicas no skype, também aprendi que comigo nunca dá certo, e desde então ela me deve um pudim de um jeito diferente feito por ela, consistente e bonito, ela também me ensinou que vale a pena lutar por quem amamos mesmo que seja doloroso, e que um problema pessoal pode ser substituido pelos problemas alheios se a nossa maneira de resolvê-los for melhor e eficiente, sabe, um dia eu estava triste e ela recitou Drummond para mim, que fantástica, desde então aquele verso que deixei se perder é agora o poema de "Drummond por Renilda Narcísio", em outra ocasião ela quis saber porque eu chamava o filho dela de idiota e eu disse "porquê ele também me chama assim... E mais, é a nossa maneira agressiva de dizer o quanto nos gostamos, depois que ele passou a ser 'o idiota' o que antes poderia ser ofensa, agora é a minha mais fiel demonstração de afeto, se o mundo fosse idiota assim, seria, por completo, feliz".

Nessa manhã sou informado que perdemos a nossa flor, tia e também mãe, que lutou durante anos pela própria vida porque sabia que outras dependiam dela, e que embora fossem crescidos, o filho sempre deve ter de garantia um futuro e o marido um presente. O dia está nublado lá fora e eu não estou feliz, porque aquela voz doce nunca se materializará na minha frente para me abraçar e me chamar de "titikinho" novamente, porque terei que me virar sozinho se quiser comer aquele pudim feito de um jeito diferente, e o que aumenta a minha tristeza, e também a da Vanessa, é o fato de não estarmos agora ao lado do nosso Idiota, o "tchau tia" ficará silênciado. A distância é traiçoeira, mas nunca impediu que a nossa amizade se perpetuasse, somos uma família que acaba de perder um membro de extrema importância, e nem um abraço podemos dar à pessoa que mais sofrerá com essa perda.

A única coisa que posso fazer é expor aqui a letra de uma música, a qual um dia em uma conversa com a tia Rê, eu disse que entoaria a minha ida desse mundo, ela amou a ideia e disse que a minha criatividade rodeava até a minha morte:

"[...]Onde você estiver, não se esqueça de mim
Quando você se lembrar não se esqueça que eu
Que eu não consigo apagar você da minha vida
Onde você estiver não se esqueça de mim"

Obrigado por tudo, oh Narciso de valor intríseco.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Algumas respostas dizem tudo

Me questiono por que somos tão assim, desse jeito; e quando mudamos me questiono por que mudamos tanto assim, desse jeito; e quando não mudamos me questiono por que está tudo tão igual assim, desse jeito; e quando pergunto, me questiono por que faço perguntas assim, desse jeito e na maioria das vezes ninguém entende e diz "estamos como?" "mudados como?" "assim como?" e eu só digo "assim, desse jeito que está agora". Se esse "assim, desse jeito" não existisse, ficaria difícil explicar como as coisas estão, na verdade a expressão não quer dizer muita coisa, mas faz deduzir que tem algo errado, ou certo, ou só tem algo que talvez não devesse ter e que "do jeito que estava antes" talvez fosse melhor, sei lá, cabe a cada um deduzir o seu "assim, desse jeito" de agora, e o "do jeito que estava antes" de antes da maneira que bem entender, mas que está diferente está, e se vier me perguntar "diferente como?" já vai saber a minha resposta, os fatos devem explicar todo o resto.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Abrindo o ano com chave de ouro-verde

Um ano promete ser bom ainda nos primeiros dias. Como o de costume o primeiro dia de Janeiro foi perpetuado com o meu "ritual singelo anual" de reunião de amigos na minha casa, um ou dois filmes - algo bem engraçado -, almofadas no chão e toda a comida que sobra do jantar da noite anterior, uma beleza! Um ponto diferente desse ano foi a ilustre presença da minha família que não viajou por um detalhe técnico que impossibilitou o uso do cartão de crédito em boa parte da Bahia (infâmia), mas tudo bem, foi divertido em igual escala, no dia seguinte um belo passeio pelo parque e assim fechamos o feriadão. Começando a semana, como era de se esperar, algo perturbadamente entranho tem que acontecer para que eu possa me reconhecer, não haveria de ser diferente.
Logo pela manhã, um homem de seus quarenta anos bate palmas à frente da minha casa, e eu o atendo gentilmente através da grade de proteção da porta dizendo

- Pois não?!
- Bom-dia. Você sabe me informar onde fica a casa do Padre?
- Ah, sei sim, é essa verde logo à frente.
Ele, faz um breve movimento com a cabeça a procura da casa indicada, mas sem sucesso volta a me chamar
- Rapaz! Qual casa verde?
- Essa aí, bem na sua frente... Na verdade como o senhor está olhando pra cá, ela está bem nas suas costas, mas se o senhor virar ela automaticamente estará na sua frente.
- É que não tem casa verde aqui.
- O senhor não vê? A verde, a única casa verde da rua.
-Não, não vejo, você tem certeza de que o Padre mora aqui?
- Claro que tenho, eu moro aqui, e sei quem mora nessa rua.
- Olha, eu estou meio sem tempo e acho que a casa não é aqui.
-Meu Deeeus! É a verde, super verde, olha direito que não é difícil, verde, verde, verde. Eu disse num tom "levemente" alterado.

Notei o olhar de incredulidade do homem, mas evitei sair para esfregar a cara dele naquela parede verde musgo gritante, tinha muito trabalho no escritório, e me dirigir até o lado de fora seria demorado - a quantidade de cadeados na minha casa é assustadora. Mais alguns minutos parado ao meu portão e em silêncio, ele entra no carro e parte, obviamente incompreendido, deveria ser daltônico ou algo do tipo, coitado. Horas mais tarde, ganho alguns afazeres que permitem a minha saida de casa, e ao cruzar o portão que dá acesso à rua dou de cara com a casa mais Rosa que eu já vi em toda minha vida - com ênfase em toda a minha vida- não só rosa, mas um rosa que diz "Oi, eu não sou Verde seu imbecil", foi um choque, juro pela sua mãe mortinha que bem cedinho quando fui à padaria a casa ainda era verde - caralho! Odeio estar errado -, jamais imaginei que em uma manhã o bendito padre fosse capaz de mandar pintarem a casa. Eu ri. Ri do pobre homem achando que eu estava tirando com a cara dele, ri da minha certeza assassina da cor daquela casa, ri da decepção do homem ao não encontrar a casa, ri da quantidade de palavrões que tive vontade de dizer àquele, até então, dautônico ou quase cego que não sabe o que é uma casa verde, e assim abri o meu ano. Feliz ano novo.